Capítulo IV




A ESPERA



     Tranquei-me no quarto, de modo a silenciar os gritos de felicidade que surgiam em meu interior. Procurei não iludir-me com possibilidades futuras – afinal, não agradaria a mim sofrer por desilusões

     Fiquei a olhar o horizonte. Minha mente se ocupava em pensar sobre mim mesma. Eu estava feliz. Livrei-me das roupas que cobriam minha pele. Como das outras vezes virei-me para contemplar aqueles traços em mim impressos. “Tudo o que está acontecendo é por causa de sua tatuagem” – recordei-me.

      Naquela mesma tarde eu, mamãe e Carolina iríamos à modista para fazer-nos os vestidos que usaríamos daqui a alguns dias no aniversário do Imperador. Ágata era a modista mais requisitada de toda corte do Império, seus tecidos e roupas esbanjavam imponência e beleza – os vestidos de mamãe era ela quem fazia.

-Está na hora Clara, vamos! – Carolina bateu à porta avisando-me com sua voz fria. – Vamos menina.

-Estou-me vestindo.



O LADO OFENSIVO


     Desci as escadas sem pressa alguma. Mamãe e Carolina já aguardavam-me dentro da carruagem ao lado de fora do Palácio – vamos filha! – Apressou-me a duquesa Paloma.

      Durante todo o percurso nenhuma palavra saíra de dentro de mim. Carolina olhava para fora, querendo olhar alguma coisa nas ruas da cidade, enquanto mamãe olhava-me e eu tentava fugir de seu olhar questionador.

-O que acontece Clara?

-Nada mamãe. Só uma dor de cabeça. Só isso. –Odiava mentir, aliás, nunca levei jeito para isto, contudo, surpreendi-me com meu desempenho naquele momento. – Logo, logo irá passar. Onde está o papai?

-Foi resolver alguns problemas no banco. – Respondeu-me Carolina lançando sobre mim um olhar penetrante – alguém tem que cuidar das finanças minha cara. Como andam os preparativos para teu casamento? – Perguntou em tom de pirraça.

-Não andam. Nada fiz ainda, se depender de mim será uma celebração simples e discreta. Tenho notado que anda saindo todos os dias, Carolina. Acaso, onde vais todos os dias?

     Senti que a aparência de Carolina empalideceu, seus lábios tremiam ao mesmo tempo que suas mãos por nervosismo –talvez – apertavam seu vestido. Mamãe olhava-a atentamente, esperando a resposta da filha. Relutando em dizer-me enquanto eu a olhava com ar de superioridade ela falou – vou à casa da Condessa de Fresnais, coitada, encontra-se doente e seu marido segue em viajem pela Europa. Somos grandes amigas e eu não poderia abandoná-la nesta fase de precisão. Não é mamãe?
-Faz bem minha filha.

     O alívio por responder-me era notável. Sei que Carolina estava odiando-me por dentro, contudo, nada podia fazer a mim. Estávamos na presença de mamãe e isso a inibia. Entretanto, eu ainda não estava satisfeita, queria dar uma amostra à minha “irmãzinha” de onde eu poderia ir para defender-me.
 
-Talvez, queira nos dizer de qual enfermidade sofre a pobre Condessa – aquele era meu lado ofensivo, uma ação provoca uma reação e digamos que a ação executada por Carolina de querer atacar-me com suas armadilhas covardes tinha-me despertado uma reação não muito agradável. – Então Carolina; esperamos tua resposta, de que mal sofre a coitada?

     Titubeantemente, atropelando palavras e fazendo pausas imprecisas Carolina disse – sarampo- para minha surpresa passou-me a impressão de falar a verdade.

     Contudo, com esta minha “irmã” não se brinca, tão traiçoeira quanto uma serpente, mantive vivo ainda em mim o espírito da desconfiança. Sei que daquele momento em diante, Carolina procuraria insistentemente e incansavelmente por uma maneira de fazer-se vingada devido aos meus ataques.

     Mamãe acreditou nas palavras dúbias de sua filha – pelo menos foi o que demonstrara. Seguimos o caminho naquele fim de tarde escaldante de verão. Direcionei meus olhos para outro lado, enquanto Carolina olhava o lado oposto ao meu.